Por que a esquerda brasileira deveria torcer pela vitória de Trump

A principal premissa das análises a seguir é pensar nos EUA como uma potência hegemônica em declínio, ou seja, uma nação que pode tomar uma medida brusca e inesperada a qualquer momento visando manter sua liderança global, e que, por isso mesmo, quanto mais problemas internos e maior necessidade de “voltar-se para dentro”, menos capital político, econômico e tempo hábil para manobras no exterior são possíveis.
Ter isso em mente e perceber que exatamente por esse fator imperial a maioria das questões centrais mundiais passa pelo crivo bipartidário de “segurança nacional” estadunidense, ajuda a derrubar a ingênua visão favorável aos Democratas em detrimento dos Republicanos.
Se o Biden for eleito, o Brasil ficará isolado no cenário internacional, já que seu outro aliado central, Benjamin Netanyahu, está ocupado demais com seus problemas internos de corrupção. As análises do momento são que isso será bom para o enfraquecimento do Bolsonaro e do bolsonarismo, um ledo engano. A ingenuidade começa quando não há distinção entre o criador e sua criação. Cada movimento rumo ao centro que Bolsonaro tenta sua base de apoio, ou seja, a militância virtual desaba em críticas e ameaças, fazendo-o recuar de olho em 2022. O que deixa a dúvida no ar: O Bolsonaro criou o monstro ou os monstros criaram Bolsonaro? Essa distinção é a base para entender a atual encruzilhada que o país se encontra.
Portanto, para evitar ser trocado por outro pseudo outisder ainda mais extremista, o que não falta nesse país, é imprescindível para o presidente continuar com sua tática de confronto direto e constante, em um cenário de guerra tudo é permitido e não há espaços para reflexões.
O grande problema com a eleição de Biden tem nome: Amazônia. Tudo o que um movimento neofascista como o bolsonarismo precisa é de um inimigo externo que possa ser visto como uma ameaça iminente à soberania nacional. Todo e qualquer comentário sobre a floresta será usado como gasolina nos corações e mentes dos seus apoiadores que acreditam que há um plano mundial de dominação que visa acabar com culturas e religiões patrocinado por multibilionários como o George Soros.
Há outra questão que pouca gente considerou: Venezuela. Como dito no começo, questões de soberania são bipartidárias aos estadunidenses, e obviamente Caracas é uma delas. Equivoca-se e muito quem acredita que os Democratas vão analisar o país de outra forma, controlar a Venezuela significa controlar ainda mais o petróleo e poder interferir no preço mundial. Ainda que os EUA sejam autossuficientes, as variáveis de poder e controle são imensas, assim como, as de preço e qualidade.
A nação norte-americana detém grandes reservas de energia, mas um tipo de extração mais cara, quando o valor do petróleo cai muito, compensa mais importar petróleo do que extrair o gás de Xisto, sua fonte de energia. Tanto é que diante da crise interna da OPEP de 2019 e a disputa entre sauditas e russos que levou os preços da commodity para o chão, os EUA interviram fortemente como um mediador crucial nas negociações.
Para além desse fator, há também a problemática aliança da nação caribenha com russos e chineses em pleno quintal norteamericano, a Doutrina Monroe nunca foi totalmente abandonada, há no íntimo dos estadunidenses que a América é sua zona de influência e isso não pode acontecer. Alguém duvida que Biden possa fazer algum tipo de proposta de aliança com o governo Bolsonaro por ajuda contra a Venezuela em troca de sossego e não interferência em questões climáticas? Alguém acha mesmo que os Democratas são esse pilar de moralidade e preocupação com o meio ambiente? Não, a eleição de Biden não trará beneficio algum ao Brasil, muito pelo contrário.
Por isso a reeleição de Trump é fundamental, ele cria atritos internos, divide o status quo do país e atrai para si toda atenção que suas polêmicas diárias criam. Até que ponto isso pode causar uma ruptura nas estruturas internas e até mesmo uma guerra civil? Isso não é problema nosso.