Eleições presidenciais na Indonésia

Desde o fim da ditadura da Nova Ordem em 1998, a Indonésia tem sido uma verdadeira história de sucesso democrático. Numa região que viu muitos líderes democráticos serem derrubados em golpes de Estado ou gradualmente se transformarem em homens fortes autoritários. O ano de 2024 marcará a sexta eleição legislativa e quinta eleição presidencial da Indonésia na era democrática do país.

No domingo, dia 22 de outubro de 2023, o candidato presidencial e Ministro da Defesa e genro do antigo ditador Suharto, Prabowo Subianto, anunciou que Gibran Rakabuming Raka seria seu companheiro de chapa. Naquela semana, o Tribunal Constitucional decidiu que funcionários eleitos com menos de 40 anos poderiam concorrer à presidência ou à vice-presidência. Isso abriu caminho para que Gibran, de 36 anos, fosse escolhido como companheiro de chapa de Prabowo. Gibran é o prefeito da cidade de Surakarta e filho do presidente Joko Widodo.

O fosso crescente entre o Presidente Joko Widodo e o Partido Democrático de Luta Indonésio (PDI-P) aumentou. A nomeação do filho mais velho do presidente como companheiro de chapa de Prabowo Subianto e a elevação do seu filho mais novo como presidente do Partido de Solidariedade Indonésio (PSI), partido que não conseguiu assentos no parlamento, gerou uma crise interna no PDI-P. Jokowi não apoiou publicamente Prabowo, a quem derrotou em disputas presidenciais anteriores em 2014 e 2019. Mas Gibran esteve presente quando uma rede de grupos por trás de Jokowi e Gibran declarou seu apoio a Prabowo em maio de 2023.

A decisão do Tribunal Constitucional gerou críticas em todo o país na TV e nas redes sociais, e o Partido Democrático de Luta da Indonésia (PDIP) alegou que houve intervenção de atores poderosos para influenciar a decisão do órgão. Esta tempestade de críticas levou a Assembleia Honorária do Tribunal Constitucional (MKMK) a demitir Anwar Usman, cunhado do Presidente Jokowi, do seu cargo de Chefe de Justiça do Tribunal.

“Esta é a maior pressão que a democracia indonésia tem sofrido desde o fim de Suharto”, disse Andreas Harsono, investigador da Human Rights Watch na Indonésia. A terceira maior democracia do mundo, acredita ele, está ameaçada.

 

Candidatos

Anies Baswedan

É um acadêmico, ativista e político indonésio do partido Nacional Democrata (NasDem), que serviu como governador de Jacarta de 2017 a 2022. Estudante ativista e analista político antes de ingressar no serviço público, ele serviu como Reitor da Universidade Paramadina antes de ser nomeado Ministro da Educação e Cultura na administração de Joko Widodo. Em sua plataforma de campanha ele promete impor mais impostos aos mais ricos alegando : “Queremos que nosso sistema tributário seja justo. Estamos falando apenas dos 100 indivíduos mais ricos, e as 100 pessoas mais ricas são mais de 100 milhões de indonésios”,

Durante seu mandato como governador de Jacarta, Anies atraiu inúmeras controvérsias por suas declarações públicas. Durante seu discurso de posse em 2017, ele afirmou “pribumi”, que significa nativo ou aborígene de forma pejorativa e era uma palavra proibida por lei:  “No passado, nós, os pribumi, éramos os conquistados. Agora, é hora de sermos os anfitriões na nossa própria terra. Trabalhamos arduamente para nos livrarmos do colonialismo e devemos desfrutar da nossa liberdade”

Em 2018, ele afirmou que a água das chuvas deve ser devolvida à Terra, como Deus quer, em vez de fluir para o mar, coleciona uma série de frases polêmicas sobre diversos temas.

Ganjar

Ganjar Pranowo é um político indonésio, formado em Direito, que serviu como governador de Java Central entre 2013 e 2023. Ele é membro do nacionalista Partido Democrático de Luta Indonésio (PDI-P). Ele é candidato às eleições presidenciais indonésias de 2024 , concorrendo ao lado do ex- presidente do Tribunal Constitucional da Indonésia , Mahfud MD . Anteriormente, representou Java Central como legislador nacional no Conselho Representativo do Povo (DPR) por dois mandatos – 2004–2009 e 2009–2013 e possui algumas suspeitas de corrupção.

Prabowo

Prabowo Subianto Djojohadikusumo é um político, empresário e ex -tenente-general do exército indonésio , atualmente servindo como Ministro da Defesa, exilou-se na Jordânia durante a queda do ditador Suharto. É descrito como um nacionalista de direita. É fundador de seu partido, o Grande Partido do Movimento da Indonésia (Gerindra)

Gibran

Gibran é como uma faca de dois gumes, por um lado, muitos partidos acreditam que ele aumentará o apoio a Prabowo em Java Central e Java Oriental, locais em que Prabowo perdeu feio em 2014 e 2019 e que são as bases eleitorais redutos de Jokowi. Prabowo calculou que, ao concorrer com Gibran, a base de apoio de Jokowi mudaria para o seu campo nas eleições de 2024. Além disso, a coligação de partidos de Prabowo assume que Gibran representa a geração mais jovem, tendo assim potencial para atrair o apoio de eleitores com menos de 40 anos.

Segundo o censo de 2020, a Geração Z, nascida entre 1997-2012, atingiu 75,49 milhões de pessoas, o equivalente a 27,94% da população total. A geração millennial nascida entre 1981-1996 atingiu 69,90 milhões de pessoas ou 25,87% da população geral. Em conjunto, os eleitores jovens (Geração Z e geração Y) representarão cerca de 52% de todo o eleitorado nas eleições de 2024.

Por outro lado, Gibran poderia na verdade tornar-se um passivo para a coligação de Prabowo. Afinal, o claro nepotismo da decisão do tribunal que permitiu sua candidatura à vice repercutiu muito mal no país, principalmente nas redes sociais, reduto desse público mais jovem. Além disso, Gibran não é Jokowi. Jokowi ascendeu ao ápice do poder vindo de baixo, sendo prefeito em dois mantados e um como governador. Enquanto isso, Gibran é prefeito de Solo há apenas dois anos.

 

Cenário Político

A partilha de poder entre as elites tornou-se uma norma, apoiada por políticas de clientelismo, a maioria dos partidos tornaram-se meros veículos para os políticos, com estruturas organizacionais relativamente abertas, facilitando a mudança de alianças e reduzindo o risco de divisões entre as elites.

A Indonésia representa um caso paradoxal em que a política iliberal, que pode ser classificada como predatória de acordo com os padrões democráticos liberais ideais, desempenha na verdade um papel na manutenção da estabilidade e na preservação da coesão da elite.

A prática de partilha de poder na Indonésia atingiu novos patamares em 2019, quando o Presidente Joko “Jokowi” Widodo fez um convite inesperado ao seu rival político, Prabowo Subianto, para se juntar ao seu gabinete como ministro da Defesa no início do seu segundo mandato

No jogo da partilha de poder, Jokowi adotou uma estratégia semelhante à do seu antecessor, Susilo Bambang Yudhoyono, formando uma coligação governamental expansiva. Jokowi alavancou o seu gabinete não só para acomodar vários partidos políticos, mas também para recompensar apoiantes leais.

Jokowi aproveitou de forma estratégica e intuitiva a natureza pragmática e oportunista dos políticos para obter vantagem política com uma extensa ligação partidária, principalmente para promover a sua própria agenda.

Outro fator que pesa é o fato de seu índice de aprovação nunca ter ficado abaixo dos 70%, chegando a quase 85% em seu auge. Isto permitiu-lhe manter o seu domínio sem precisar ser um líder partidário de fato. No entanto, este elevado índice de aprovação também torna a sua coligação excessivamente dependente da popularidade e personalidade de Jokowi.

Tornar-se parte da oposição é menos atraente para os partidos, não só porque lhes falta uma agenda política coerente, mas também porque os mantém afastados dos recursos estatais. Os pequenos e médios partidos da Indonésia tendem a ter uma estrutura partidária aberta, facilitando a fácil circulação das elites políticas.

Isto é crucial para manter a coesão da elite, pois incentiva ligações intrapartidárias que minimizam conflitos e desacordos. Algumas elites podem facilmente mudar de um partido para outro sem estarem amarradas e muitas vezes atuam como intermediários do poder.

 

Cenário Partidário

No sistema presidencial multipartidário e multifacetado da Indonésia, as eleições legislativas são altamente fracionadas, com os maiores partidos legislativos recebendo normalmente cerca de um quinto dos assentos na Câmara dos Representantes do país. O maior partido legislativo da Indonésia, o Partido Democrático de Luta da Indonésia (PDI-P), detém 22% dos assentos no atual Congresso.

Para governar eficazmente com uma legislatura tão fragmentada, o presidente deve reunir uma coligação governamental composta por pelo menos três partidos legislativos. Desde 1999, a política indonésia tem sido caracterizada por coligações legislativas cada vez maiores e sobredimensionadas. Para muitos, estas coligações funcionam como cartéis e não como coligações legislativas regulares. Numa coligação legislativa “normal”, os partidos esforçam-se por limitar o número de partidos no governo para maximizar os benefícios que recebem por estarem na coligação. A lógica do “cartel” é diferente: adicionar o maior número possível de partidos à coligação governamental para eliminar o máximo possível de oposição legislativa.

Por exemplo, Jokowi derrotou Prabowo nas eleições de 2014 e 2019. Especialmente depois da campanha de 2014, muitos analistas expressaram alívio pelo fato de o progressismo e o pluralismo de Jokowi terem derrotado o identitarismo religioso e a política do homem forte da campanha de Prabowo. Muitos viam Prabowo como uma ameaça direta à democracia indonésia.

Além de ser famoso pelo seu temperamento e pela corrupção da sua família, foi cúmplice de várias violações dos Direitos Humanos de grande repercussão durante o seu tempo como oficial militar, desde massacres durante a ocupação de Timor pela Indonésia. -Leste ao desaparecimento de manifestantes pró-democracia e à violência anti-chinesa em 1998. E ainda instigou protestos após o anúncio da sua derrota em ambas ocasiões, gerando tumultos e até mortes nas ruas, mesmo assim, o vencedor o convidou para ser parte do governo.

Especula-se que Jokowi tenha colocado seu filho como vice de Prabowo pois ele teria mais alinhamento com suas grandes políticas, como a construção da nova capital, portanto, estaria mais preocupado com seu legado político e seu desejo de construir uma dinastia do que com seu próprio partido e o bom andamento da inda frágil democracia indonésia.  Mas o fato é que os olhos do mundo estarão voltados para essa eleição asiática.

Segundo a lei indonésia, uma chapa presidencial necessita da maioria dos votos expressos para ser eleita. Se nenhuma chapa obtiver 50% dos votos, os dois primeiros colocados participarão de um segundo turno a ser realizado em junho de 2024.

 

Pautas

Defesa nacional

Todos os três comprometeram-se a expandir e modernizar as Forças Armadas Nacionais da Indonésia, bem como manter a política externa não alinhada da Indonésia, incluindo a não adesão a alianças geopolíticas/militares.

Nos seus manifestos eleitorais, Anies Baswedan e o seu companheiro de chapa, Muhaiman “Cak Imin” Iskandar, sublinharam especificamente a importância de a Indonésia ter uma marinha de águas azuis e uma “força aérea automatizada”. Paralelamente, querem aumentar a representação das mulheres.

Além disso, o antigo governador de Jacarta disse que pretende padronizar o sistema de armas do exército para simplificar a manutenção. Disse também que não quer que a Indonésia se junte a grupos de segurança minilaterais, como o Diálogo Quadrilateral de Segurança, mais conhecido como Quad, uma vez que o não-alinhamento é uma das pedras angulares da política externa do país e isso pode alterá-la drasticamente.

Enquanto isso, a dupla Ganjar Pranowo-Mahfud MD adotou o conceito de “Sistema de Defesa 5.0”, que enfatiza as capacidades estratégicas de projeção de poder e melhoria no aspecto de Defesa cibernética do país, incluindo a formação de uma Força Cibernética como o novo quarto serviço do exército.

Além disso, Ganjar prometeu aumentar significativamente o orçamento de Defesa marítima, citando o vasto território marítimo e a natureza arquipelágica da Indonésia, e o fato de outros países da Ásia terem aumentado substancialmente os seus próprios orçamentos de defesa.

O Ministro da Defesa, Prabowo Subianto, e o seu candidato a vice-presidente, Gibran Rakabuming Raka, comprometeram-se a aumentar gradualmente o orçamento geral da Defesa e a reforçar o número de reserva militar. Prabowo cita frequentemente a afirmação de Tucídides de que “os fortes fazem o que podem e os fracos sofrem o que devem”

O orçamento anual da Defesa normalmente representa apenas 0,6% a 0,8% do PIB. A dificuldade para o candidato vencedor não é apenas a situação financeira do Estado, mas também como assegurar ao público que é necessário um aumento nas despesas com a defesa.

 

Política externa

Ganjar expos a sua visão de política externa no seu manifesto de campanha recentemente lançado, “Rumo a uma Indonésia Excelente”, que afirma como objetivo alcançar “uma nação marítima avançada, justa e sustentável”.

Prometeu manter o princípio de política externa “livre e ativa” que o país tem perseguido desde a sua independência, mas defende uma redefinição de prioridades destes conceitos para se adaptarem ao cenário global em mudança.

Como afirmou Ganjar num evento recente no Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais em Jacarta, “’livre’ tem de ser definido como sendo independente na formulação de políticas estratégicas, enquanto ‘ativo’ significa que a Indonésia deve criar as suas próprias iniciativas internacionais em vez de simplesmente respondendo passivamente aos acontecimentos internacionais.”

Ele prometeu procurar soluções mais inovadoras para transformar a Indonésia num “fulcro marítimo global”, como Jokowi pretendia, mas aos olhos de muitos não conseguiu cumprir. Isto sugere um certo grau de continuidade da política externa entre Jokowi e uma possível presidência de Ganjar.

Ganjar falou em atribuir um papel mais importante ao corpo diplomático da Indonésia. Ele prometeu reformar o Ministério dos Negócios Estrangeiros e aumentar o seu orçamento, a fim de ampliar o papel que os diplomatas indonésios podem desempenhar a nível internacional.

Asean

Sobre a Asean, espera-se que Prabowo tente recuperar o papel central, ou mesmo o domínio, da Indonésia no órgão, que diminuiu à medida que Jokowi prestou menos atenção à Asean. Prabowo provavelmente também melhoraria a cooperação em Defesa entre os EUA. Segundo autoridades de Washington, ele tem trabalhado bem com o Pentágono, enquanto a Indonésia e os Estados Unidos construíram recentemente uma relação de segurança mais estreita. Se os outros concorrentes o fariam, ainda não está claro. A base de Anies não gosta dos Estados Unidos e Ganjar é muito inexperiente em assuntos externos, embora ambos os candidatos também tentassem recuperar o papel central da Indonésia na ASEAN.

Prabowo provavelmente também melhoraria os laços de segurança com o Japão, que se tornou cada vez mais assertivo na construção de laços de defesa com estados do Sudeste Asiático, como as Filipinas e o Vietnã. No entanto, os seus alegados abusos passados ​, e o potencial para se voltar para o populismo autoritário se for eleito, poderão retardar a cooperação com os Estados Unidos.

Debate

Após um debate de duas horas e meia, o diário Kompas de Jacarta entrevistou por telefone 210 entrevistados em toda a Indonésia. Descobriu-se que Ganjar obteve um índice de aprovação de quase 80%, Anies conquistou mais de 70%, deixando Prabowo com pouco menos de 49%. Embora dificilmente seja uma medida definitiva, o resultado foi ilustrativo de que Prabowo esteve em desvantagem durante todo o debate numa área em que deveria sentir-se confortável, dado o seu papel passado como responsabilidade ministerial geral e presente.

 

Segundo turno

Os Dois candidatos presidenciais estão em negociações intensas para formar uma aliança para derrotar o favorito Prabowo Subianto, mostrando como as diferenças políticas ficam em segundo lugar na corrida para liderar a maior economia do Sudeste Asiático.

Nas últimas semanas, autoridades que apoiam o ex-governador de Java Central, Ganjar Pranowo, e o ex-governador de Jacarta, Anies Baswedan, reuniram-se discretamente várias vezes para discutir um possível pacto. Isso pode incluir a intensificação da sua campanha em áreas dominadas por Prabowo, numa tentativa de diluir os seus votos e forçar um segundo turno, de acordo com pessoas de ambos os campos que não quiseram ser identificadas porque o assunto é delicado.

Representantes do campo de Ganjar não responderam aos pedidos de comentários. Em 9 de janeiro, o próprio Ganjar disse aos repórteres que “tudo é possível” quando questionado sobre os rumores das negociações que circulavam na mídia local há dias.

 

Pesquisa Eleitoral

A última pesquisa nacional até o momento (23/01/2024) concluiu que muitos eleitores indonésios que apoiam um partido nas eleições legislativas podem não apoiar o candidato presidencial escolhido pelo partido. Os três candidatos presidenciais são mais apreciados pelos seus traços de personalidade do que pelas suas posições políticas. Em suma, a personalidade ainda prevalece sobre a política no país.

63% dos entrevistados que escolheram o partido Nacional Democrata (NasDem) indicaram que votariam no candidato desse partido, o ex-governador de Jacarta, Anies Baswedan. Para contextualizar, Anies é consistentemente classificado em terceiro lugar nas classificações de elegibilidade, atrás dos seus oponentes, o ministro da Defesa, Prabowo Subianto, e o antigo governador de Java Central, Ganjar Pranowo. Mais preocupante para Anies, a pesquisa indicou que apenas 48% elegeriam legisladores do partido do seu companheiro de chapa, Muhaimin Iskandar, o Partido do Despertar Nacional (PKB), votariam em Anies.

Mesmo o favorito não é poupado desta ambivalência eleitoral. Embora 90% dos entrevistados que votariam nos legisladores de Gerindra escolheriam Prabowo, apenas 53% do Partido Democrata, seu parceiro de coligação (Partai Demokrat, PD),

Ganjar tem uma ligeira vantagem em relação ao seu partido, o Partido Democrático de Luta da Indonésia (PDI-P). Mais de 69% por cento, dos que votariam nos legisladores do PDI-P indicaram que votariam em Ganjar, um reflexo da renomada disciplina partidária do PDIP.

Dado um cenário de corrida de três cavalos, aqueles que votariam em Ganjar indicaram a maior aprovação ao atual Presidente Joko Widodo (Jokowi). Isto ironicamente sugere que Ganjar, e não Prabowo, pode ser o herdeiro percebido pelo povo do legado de Jokowi, mesmo que o companheiro de chapa de Prabowo seja o filho mais velho de Jokowi. Na verdade, 90% e 81% dos apoiadores de Ganjar e Prabowo, respectivamente, estavam “bastante” ou “muito” satisfeitos com o desempenho de Jokowi.  O que embola a corrida presidencial e deixa o cenário totalmente incerto sobre a colocação final dos candidato e até mesmo a possibilidade de segundo turno.

 

O islã na política

Sob o regime da Nova Ordem de Suharto (1966-1998), as elites religiosas indonésias geralmente não participavam na política formal, Todos os partidos políticos islâmicos foram agrupados sob o PPP (Partido Unido do Desenvolvimento).

Da década de 1970 ao final da década de 1990, partidos políticos islâmicos como Nahdlatul Ulama (NU), Partai Islam Persatuan Tarbiyah Islamiyah (PERTI), Partai Syarikat Islam Indonesia (PSII) e Partai Muslimin Indonesia (PARMUSI) só podiam funcionar sob um único partido, o Partido Unido do Desenvolvimento (PPP). Em 1984, o NU retirou-se oficialmente da política formal depois que seu presidente Abdurahman Wahid (ou Gus Dur) declarou que a organização Kembali ke Khittah (Retorno a Khittah) deveria retornar às suas raízes originais e se concentrar na educação e no bem-estar islâmicos.

Depois de 1998, as elites religiosas permaneceram divididas no que diz respeito à participação política diante do novo cenário democrático. Alguns evitam e preferem não se associar a quaisquer políticos ou partidos, por medo da “corrupção” ou da “cooptação” das suas ideias religiosas. Outros apoiam abertamente os partidos políticos, defendem papéis políticos claros para si próprios e fazem lobby junto dos seus aliados para posições políticas, em nome da promoção dos objetivos islâmicos.

A confusão se torna maior quando antigos partidos retomam o cenário político com outras siglas, fazendo dessas instituições um híbrido entre política e religião. NU e Muhammadiyah participaram no processo eleitoral através de novos veículos como o PKB (Partido do Despertar Nacional) e o PAN (Partido do Mandato Nacional), respectivamente.

O movimento religioso dos anos 70 tinha uma abordagem em que colocava o Islã como uma vertente ou um modo de vida alternativo ao ocidente secular, os cientistas políticos referem-se a esta facção como islâmicos políticos. Hoje, o movimento em ascensão é chamado de pós-islâmico, agora a ideia central é a de que os muçulmanos deveriam concentrar-se mais no trabalho comunitário e no desenvolvimento de estilos de vida compatíveis com a sharia, em vez de pressionar por regras rígidas e leis formais através da burocracia do Estado.

Há também um movimento que pode ser chamado de progressista, nele estão os religiosos que alegam que valores morais como a justiça, a honestidade, a igualdade e a moderação como sendo a essência da abrangência do Islã, portanto, não pertencentes unicamente ao Estado ou uma ideia exclusiva ao ocidente. Eles argumentam que o Alcorão e a Sunnah (ditos do Profeta Maomé e seu comportamento durante sua vida, que se tornaram uma fonte de lei e orientação para os muçulmanos contemporâneos) não estipulam injunções claras para estabelecer uma forma particular de governo, nem exigem para a formação de partidos islâmicos.

Por ser o país com maior número de muçulmanos do mundo, e talvez pelo território fragmentado e historicamente plural, a religião acaba não tendo a força de ser captada por uma só corrente ou uma só figura, na academia várias são as formas de analisar distinções entre as inúmeras correntes religiosas. Há “os que vivem em Java versus aqueles que vivem fora de Java”; “escolas religiosas locais versus líderes nacionais”; “tradicionalistas e influenciadores digitais”, Sufismo versus Salafismo e por aí vai.

No entanto, esses líderes religiosos proporcionam um bom capital de voto. Os políticos podem participar de rituais religiosos, financiar escolas religiosas e mesquitas e até realizar uma peregrinação publicitada a Meca, mas a melhor opção é obter o apoio direto das elites religiosas que possam mobilizar os seus seguidores e estudantes em apoio aos seus patronos políticos.

Nas próximas eleições, é provável que esta tendência continue, à medida que os partidos políticos pretendem aumentar a sua legitimidade islâmica, a maioria dos muçulmanos continua a procurar orientação das elites religiosas, que consideram indivíduos justos e racionais e que tomarão decisões com base nos princípios islâmicos. Algo que ocorre em todos os lugares do mundo nos dias de hoje.

 

O caso NU

A Nahdlatul Ulama (NU) – a maior organização religiosa do país – com mais de 45 milhões de apoiadores está no centro da disputa eleitoral. A NU promove um tipo tradicionalista de Islã que aceita melhor as tradições locais únicas da Indonésia, o sincretismo não é visto com bons olhos por parte de outras vertentes do islã.

A sua dedicação aos valores islâmicos, ao bem-estar social e à tolerância religiosa apela a um amplo espectro de muçulmanos. Também mantém uma rede popular de escolas, universidades, hospitais e grupos agrícolas que permeiam as áreas urbanas e rurais. Esta influência é o que torna o endosso da NU tão procurado. Mas, como organização, a NU não apoia explicitamente partidos ou candidatos políticos, nem se envolve diretamente em política prática – pelo menos em teoria.

O atual vice-presidente do país é um líder renomado da NU, o clérigo Ma’ruf Amin. As contradições seguem como sempre, A relação entre os partidos políticos e a NU exige uma navegação cuidadosa. Os partidos devem alinhar-se com os princípios e objetivos da NU sem comprometer as suas próprias ideologias. Devem garantir que a sua agenda complementa os objetivos e a filosofia do NU, evitando ao mesmo tempo a percepção de favorecer apenas o NU, o que poderia correr o risco de alienar outras bases eleitorais essenciais.

Por exemplo, um endosso da NU poderia ajudar Ganjar a defender-se contra campanhas religiosas dos seus concorrentes. No entanto, a seleção de um companheiro de chapa abertamente religioso pode isolar a base secular-nacionalista do seu próprio partido. Da mesma forma, um companheiro de chapa afiliado à NU poderia ajudar Anies a consolidar o voto islâmico, fortalecendo o seu apelo junto dos muçulmanos moderados. Mas também terá de gerir cuidadosamente as tensões entre as perspectivas tradicionalistas e modernistas que também fazem parte dos seus apoiadores.

E obviamente o cenário inverso é igualmente verdadeiro, devido ao fragmentado cenário político e religioso do país, apoio aberto a algum partido ou político pode afastar seus próprios fieis de seus centros

 

No dia 30/01, vazou um aúdio do clérigo Abu Bakar Bashir declarado apoio ao candidato Anies, alegando que ele vai “tentar governar este país com as leis islâmicas, tanto quanto possível”. Abu é um radical islâmico acusado e condenado por estar por trás do atentado de Bali em 2002. Ele é considerado o “pai espiritual” do Jemaah Islamiyah, organização terrorista indonésia que tem ligações com a Al-Qeda e que já fez diversos ataques no país.

 

Referências

 

Indonesia Votes 2024: Personality Versus Policy in the Presidential Election

https://www.thejakartapost.com/news/2017/10/17/aniess-pribumi-speech-sparks-debate-racist-comments-on-social-media.html

https://en.tempo.co/read/1814286/anies-baswedan-vows-to-tax-100-richest-indonesians-more-as-president

https://www.lowyinstitute.org/the-interpreter/indonesia-s-presidential-frontrunner-falters-debate-could-win-election

https://www.scmp.com/news/asia/southeast-asia/article/3249010/indonesia-election-2024-rivals-ganjar-and-baswedan-eye-deal-thwart-widodos-succession-plan

https://www.cfr.org/in-brief/indonesias-presidential-election-old-guard-faces-new

https://www.brookings.edu/articles/indonesias-election-reveals-its-democratic-challenges/

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The Prabowo-Gibran Pairing: Wise or Foolish?

https://thediplomat.com/2023/12/a-litmus-test-for-indonesian-democracy/

The President and His Political Party: An Impending Collision

https://thediplomat.com/2023/11/where-indonesias-presidential-candidates-stand-on-national-defense/

https://thediplomat.com/2023/11/where-does-ganjar-pranowo-stand-on-indonesias-foreign-policy/

https://en.wikipedia.org/wiki/Anies_Baswedan

https://thediplomat.com/2023/10/explaining-indonesias-political-stability/

https://asia.nikkei.com/Politics/Indonesia-election/Radical-Indonesian-cleric-gives-backing-to-presidential-hopeful-Anie

shttps://indonesiaatmelbourne.unimelb.edu.au/the-fight-for-nahdlatul-ulama-in-2024/

https://www.iseas.edu.sg/articles-commentaries/iseas-perspective/2023-86-the-dilemma-of-political-involvement-among-muslim-theologians-in-indonesia-by-norshahril-saat-and-ahmad-muhajir/