As minorias devem se curvar a maioria?

 

Hoje no Brasil há quase um consenso sobre o assunto, principalmente após ser defendido publicamente pelo Presidente eleito Jair Bolsonaro. Basta conversar com amigos e familiares que muitas frases absurdas cobertas sob um manto pseudo democrático florescerão. Está na moda a defesa da democracia plena, ou seja, plebiscito e referendo sobre todos os assuntos, a maioria define e fim. Acontece que essa democracia plena não existe em lugar algum do mundo, nem mesmo nos países que possuem as mais invejáveis qualidade de vida.

As democracias ocidentais são baseadas nas ideias de Montesquieu (séc XVIII), que criou o sistema de tripartição de poder (Legislativo, Executivo e judiciário), onde cada um tem sua função, mas que secundariamente podem, em casos excepcionais, agir em temas pertinentes a outro. Essa relação é chamada de freios e contrapesos, pois visa igualar e consequentemente nivelar para que nenhum poder se sobressaia a outro, criando uma paridade da máquina estatal visando coibir eventuais abusos. Acontece que o “povo” não deixa de ser também uma instituição, e portanto, não pode decidir livremente sobre tudo e todos, a população também precisa de seus freios e contrapesos, caso contrário, não haveria mais democracia, e sim, a ditadura da maioria.

Também no Séc XVIII, Jeremy Bentham e John Stuart Mill criaram o “Utilitarismo”, uma doutrina ética mas que pretendia se expandir para todos os ramos do conhecimento e dos hábitos e costumes da sociedade. Basicamente, o Utilitarismo defende a maior felicidade possível para a maior quantidade de pessoas possíveis. Não demorou muito para que muitas críticas passassem a surgir juntamente com essa corrente de pensamento.

Deixando as questões subjetivas sobre felicidade de lado, o Utilitarismo esbarrou em um problema de ordem prática. Poderia então, passar a enforcar pessoas em praças pública se a maioria assim desejasse? Torturar criminosos para conseguir informações importantes? Se isso tudo passar a acontecer, ainda vale a premissa que esses atos causariam maior felicidade do que dor a sociedade em geral? Como medir isso? E então veio a crítica final, em uma sociedade ainda pouco secular, foi lembrado que Cristo morreu pelo voto da maioria puro e simples, visando justamente essa tal satisfação sem freio e contrapeso algum.

Assim está a sociedade brasileira, que se viu representada em um candidato igualmente defasado. Propõem como ideia vanguardista uma discussão enterrada há mais de duzentos anos.

 

Valter Peixoto Neto – 30/10/2018