Arábia Saudita x Irã
Arábia Saudita e Irã são regimes declaradamente islâmicos, produtores de petróleo, membros da OPEP, pertencentes à mesma sub-região do Oriente Médio, mas suas semelhanças param por aí.
História do Reino da Arábia Saudita
O Reino da Arábia Saudita teve seu nome oficialmente adotado no ano de 1932 a partir da estratégia de expansão do emirado de Najd por Abdul Aziz bin Saud, essa monarquia se estruturou e se fortaleceu desde então.
Sua origem data do século XVIII quando Muhammad bin Saud, criador da Casa dos Saud, e Muhammad Abd bin al-Wahhab, fundador do movimento wahabita fazem uma aliança de poder temporal e espiritual, respectivamente.
Esse acordo permitiu a expansão do emirado de Saud para uma expressiva parcela da Península Arábica, conquistando os chefes tribais através de seu exército e de sua ideologia islâmica. O Estado da família Saud conquistou as cidades sagradas do mundo islâmico, Meca, Medina, e chegou ao extremo sul da península.
O emirado foi declarado um sultanato em 1912, e, devido ao interesse britânico em enfraquecer o Império Turco-Otomano, desenvolveu-se uma relação de cooperação entre o Sultanato do Najd e a Inglaterra
A Arábia Saudita era um dos países mais pobres do mundo, tendo ainda de lidar com a complexa função de protetora das cidades sagradas, o que envolvia um intenso trabalho para garantir o direito dos muçulmanos de realizarem sua peregrinação.
A descoberta de petróleo ocorreu em 1938, mas sua exploração só teve início após a Segunda Guerra. A sobrevivência econômica do reino só foi possível devido ao auxílio concedido pelo governo dos Estados Unidos, parceria que dura até hoje.
A organização política da monarquia saudita era extremamente rudimentar, os primeiros ministérios a serem criados foram o de Negócios Exteriores (1930) e de Finanças (1932).
A Lei Saudita Básica de Governança de 1992 é uma espécie de Constituição, é o principal documento de organização da monarquia, buscando modernizar o país sem afetar as estruturas de poder nem ameaçar a estabilidade política.
A partir desse documento, criou-se o Majlis saudita, que, embora tenha um nome e uma composição semelhante à de um parlamento, não possui as funções legislativas esperadas de um, mas apenas a função de um órgão consultivo do monarca.
História da República Islâmica do Irã
O Irã teve suas origens na antiga civilização persa. Durante o final do século XIX, a expansão europeia sobre o continente asiático e o “Grande Jogo”(período de disputas imperialistas entre Rússia e Inglaterra pelo controle da Ásia Central), levaram a uma dominação do povo persa por russos e britânicos, que dividiram o país em zonas de influência, sendo mantida oficialmente a monarquia dos Qajar.
A entrada do Irã no século XX assistiu à primeira das duas grandes revoluções pelas quais o país passou, a Revolução Constitucional, que resultou na criação de um parlamento (Majlis) em 1906, tornando a monarquia iraniana constitucional
A dinastia Qajar, contudo, não conseguiu manter seu controle sobre o país e foi deposta em 1921 por um golpe militar empreendido por Reza Khan Pahlavi, apoiado pelos britânicos que tinham interesse no petróleo da região. O governo militar foi substituído por uma monarquia em 1926, quando Reza nomeou-se xá (título do monarca no Irã), instaurando a dinastia Pahlavi como monarcas iranianos.
Instaurando no Irã um governo alinhado aos interesses ocidentais, contudo, o monarca procurou resistir às tentativas britânicas de criar um relação de controle mais forte, buscando intensificar sua legitimidade interna e diversificar suas relações exteriores, o que aproximou o Irã da Alemanha nazista. Resultando na ocupação do país pelos Aliados durante a Segunda Guerra Mundial, que depuseram o rei e forçaram sua sucessão por seu filho Mohammad Reza Pahlavi em 1941.
A partir de então, a monarquia iraniana se manteve extremamente dependente e alinhada ao Ocidente, o comércio estadunidense e britânico se tornou indispensável para a manutenção da monarquia. Essa dependência desenvolveu um pensamento crítico a uma oposição interna ao regime e às posições do xá.
A principal oposição foi o Partido Tudeh, que reunia diversos integrantes da esquerda iraniana, um segmento fortemente combatido pelos monarcas desde o início do século. Assim, o partido foi alvo de repressão governamental, tendo vários de seus membros perseguidos, assassinados, torturados ou expulsos do país
Além dos grupos de esquerda, dois outros grupos se destacaram na oposição ao xá: os nacionalistas e os islamitas. O principal representante da oposição nacionalista foi o primeiro-ministro entre 1951 e 1953 Mossadeq, que conseguiu aprovar uma lei que nacionalizava o petróleo iraniano, surpreendo o xá e desagradando potências e empresas ocidentais.
Mossadeq avançou contra os poderes da monarquia iraniana, passando leis que reduziam o poder do xá, que acabou por fugir do país. Os aliados externos do xá, insatisfeitos com a situação, resolveram atuar contra Mossadeq: em 1953, uma operação da CIA que ficou conhecida como Operação Ajax resultou na derrubada do primeiro-ministro, restaurando ao xá o controle absoluto do país.
A situação política interna do xá se tornou extremamente delicada, enfrentando oposição de diversos grupos e segmentos da sociedade iraniana. Três partidos políticos representavam essa oposição nos meios convencionais de organização política: o Tudeh, a Frente Nacional e o Movimento de Libertação. Além da forte oposição clerical
A onda de protestos que resultou na Revolução Islâmica Iraniana de 1979 teve início em 1977, quando eclodiram protestos da classe média, resultado de uma piora da situação econômica do país, com o crescimento da inflação. A solução encontrada pelo governo fora, inicialmente, o repasse desses custos à classe empresarial, mas, como essa estratégia não surtiu os resultados esperados, optou-se por transferir tais custos aos pequenos empresários.
No final de 1978, a classe operária aderiu aos protestos contra o xá, dando um novo nível ao movimento. O regime alternou sua reposta entre concessões políticas, como anistia a diversos políticos opositores e trocas de gabinetes, e intensificação da repressão aos manifestantes.
Com o fortalecimento do movimento e da imagem de Khomeini, houve uma estratégia por parte do aiatolá de fortalecer a causa islâmica em detrimento dos grupos marxistas. Em 1979, Khomeini retornou ao Irã enquanto o xá fugia para Paris.
Assim, o aiatolá clamou pelo estabelecimento de uma república islâmica e criou comitês, intensificando o conflito com o governo, que acabou por vencer. A Revolução Islâmica representou a ascensão do corpo clerical xiita ao poder
Embora o movimento revolucionário de 1979 tenha sido bastante diversificado em sua composição, que incluía intelectuais, classe média, comerciantes, classe operária, militantes de esquerda, e militantes islâmicos, entre outros, Khomeini conseguiu juntar os diferentes grupos de forma a consolidar seu plano de islamização do país, que se concretizou através da Constituição de 24 de outubro de 1979, que instituía a república islâmica.
O sistema político da Arábia Saudita
O Reino da Arábia Saudita não possui constituição, seu documento legal que assume certas funções de uma constituição é a Lei Básica de Governança. O objetivo da Lei é oficializar o sistema político do país, após sua adoção, dois novos corpos políticos tomaram forma: o Conselho Consultivo e o Conselho de Lealdade.
Nenhum dos principais órgãos políticos sauditas é escolhido pela população, sendo todos definidos pelo rei ou pela família real. Os principais postos e as principais organizações públicas no país são chefiados por integrantes da família Saud.
O poder judiciário segue a Lei Básica de Governança, supostamente independente, estando suas decisões em cortes e tribunais fora do controle do rei, mas a responsabilidade pela implementação das decisões judiciárias cabe ao rei.
O Sistema político do Irã
Assumindo como base a lei islâmica, o Irã possui um sistema político único no mundo: uma república islâmica. Nesse sistema, os órgãos políticos podem ser divididos entre aqueles eleitos diretamente pela população através de eleições e aqueles escolhidos indiretamente, por outros órgãos. A falta de renovação, a presença predominante de religiosos e os grandes poderes desses órgãos no sistema político são utilizados como fatores para criticar o sistema político iraniano.
O poder executivo no Irã é dividido pelo líder supremo e pelo presidente, que possui um conselho de ministros que o auxilia na condução de suas atividades. A escolha do presidente se dá através de eleições diretas. Os candidatos à presidência, contudo, devem ter suas candidaturas previamente aprovadas pelo Conselho de Guardiões, que também é encarregado de supervisionar as eleições. O presidente é eleito para mandatos de quatro anos, podendo servir apenas dois mandatos consecutivos
O líder supremo é a autoridade máxima, tem o papel político e de líder religioso do xiismo iraniano. Por isso, a escolha do indivíduo que ocupa esse posto deve obedecer a determinados critérios: alto grau de instrução religiosa, piedade e justiça, perspicácia política e social, prudência, competência administrativa, entre outras.
A escolha do líder supremo é feita pela Assembleia de Peritos, um órgão composto por noventa e seis membros escolhidos por voto popular, respeitando uma distribuição dos assentos por região do país. O cargo de líder supremo é vitalício, embora ele possa ser destituído do cargo, caso a Assembleia de Peritos o julgue inapto a continuar governando.
A Assembleia Consultiva Islâmica é composta por duzentos e setenta deputados, que são eleitos por voto popular, sob a supervisão do Conselho de Guardiães. E por incrível que pareça, há assentos reservados para indivíduos das minorias do país, que são os zoroastrianos, os judeus e os cristãos, e pode criar leis sobre todos os temas, desde que não desrespeitem a Constituição ou o Alcorão.
O poder judiciário é chefiado pelo líder do Judiciário, sendo auxiliado nessa função pelo ministro da Justiça. O líder do Judiciário é escolhido pelo líder supremo por suas qualidades morais e por seu conhecimento de assuntos jurídicos para um mandato de cinco anos. É de sua responsabilidade a manutenção de uma estrutura para o cumprimento da Constituição e tem um papel fundamental da escolha de novos juízes. Os juízes não podem ser removidos de seu cargo a não ser através de comprovação de sua culpa em tribunal.
Participação política na Arábia Saudita
Inexiste participação popular na definição dos rumos políticos do país, partidos políticos não são permitidos pela lei saudita, e as únicas eleições que são realizadas são para os conselhos municipais locais. As primeiras eleições nacionais para esses conselhos foram realizadas em 2003, sendo apenas metade dos assentos determinada por voto popular. O direito a voto foi limitado a homens maiores de 21 anos, ou seja, apenas 20% da população.
Uma importante ameaça à estabilidade da Arábia Saudita é a população xiita do país, que habita principalmente a Província Oriental, onde se desenvolve a exploração do petróleo saudita. Os xiitas não gozam dos mesmos direitos dos sunitas, gerando um sentimento de insatisfação para com os Saud por parte dessa minoria religiosa.
Assim, a partir de 1979, os xiitas começaram a gerar tensões no país, protestando contra sua situação desigual. O início desses protestos foi concomitante à Revolução Iraniana, o que levou a monarquia a relacionar o governo iraniano às tensões com os xiitas sauditas.
Participação política no Irã
A Constituição iraniana permite a reunião e a associação de indivíduos para formar partidos, sociedades, associações políticas ou profissionais e sociedades religiosas (que ultrapassam os cem), inclusive para as religiões minoritárias do país. Essa liberdade só pode ser revogada caso tais organizações violem os princípios de independência, liberdade e unidade nacional, os critérios do Islã ou as bases da república islâmica.
No período que sucedeu a Revolução Iraniana, o sistema político iraniano foi dominado pelo Partido Republicano Islâmico (PRI), num processo que se acreditava que levaria a um regime de partido único mas o Partido Republicano Islâmico não conseguiu homogeneizar seus membros, o que demonstrou a fragilidade da união de todos os grupos em um só partido.
As duas grandes correntes políticas iranianas são o conservadorismo e o reformismo: enquanto os conservadores dominam os órgãos não eleitos e possuem divisões internas concorrentes, os reformistas representam a luta por uma maior democratização do sistema político.