Ep 05: Arábia Saudita e os afagos norte-americanos – por Luis Rutledge

*Essa coluna mensal é derivada da parceria do MenteMundo com o Luis, e que faz parte também, um podcast para debater esse assunto, confira aqui

Cenário Energético

As sanções impostas pela União Europeia e EUA contra a Rússia, refletiram de imediato no mercado global de óleo e gás. Com a escala de alta dos preços do barril, uma necessidade urgente de novos fornecedores para a Europa fez com que mais uma vez os europeus se voltassem para os países do Golfo Pérsico. Certamente, a agitação do mercado do petróleo favorece os países exportadores do Oriente Médio e de outros centros produtores. Porém, parte dos problemas que o continente europeu está enfrentando não são somente os preços inflacionados da energia. E sim, o fato de que grande parte das reservas de óleo e gás em produção estarem com seus mercados comprometidos, inviabilizando ofertas adicionais para o mercado europeu.

Dentre os países do Oriente Médio, a Arábia Saudita se destaca por possuir cerca de 17% das reservas comprovadas de petróleo do mundo. E desta forma, os sauditas ao lado do Catar, gigante do gás natural, ganharam significativa influência geopolítica no atual cenário energético mundial. De fato, as exportações de petróleo bruto da Arábia Saudita aumentaram em junho deste ano, apresentando números expressivos de 7,196 milhões de barris por dia (bpd). Em maio, as exportações foram de 7,050 milhões de bpd. Em termos de produção, o mês de junho apresentou relativo aumento quando comparado com o mês anterior, indo de 10,538 milhões de bpd para 10,646 milhões de bpd. Segundo executivos sauditas, a Saudi Aramco possui condições de aumentar a produção em até 12 milhões de bpd. A título de comparação, o potencial de produção de óleo saudita é atualmente equivalente aos números russos, demonstrando a importância do país árabe na produção global, Figura 1.

Figura 1 – Produção de Petróleo

 

Cenário Geopolítico

Em meio ao atual momento energético, uma recente visita à Arábia Saudita agitou a geopolítica do petróleo. Joe Biden se encontrou com Mohammed bin Salman Al Saud, príncipe herdeiro da Arábia Saudita.

Em um primeiro momento, o presidente dos EUA, Joe Biden, se reuniu com o príncipe para solicitar um aumento das produções de óleo da Arábia Saudita e assim tentar reduzir as pressões globais por maior oferta de energia, Figura 2. O príncipe de imediato esfriou as pretensões norte-americanas. Apesar dos sauditas alegarem que a impossibilidade de aumento de produção esteja atrelada às dificuldades técnicas e aos acordos comerciais já firmados de longo prazo, sabe-se que os verdadeiros motivos são puramente geopolíticos.

As relações entre os EUA e a Arábia Saudita, parceiros tradicionais, não são as melhores nos últimos anos. Ainda no período de campanha presidencial, Joe Biden deixou claro suas preocupações contra graves violações dos direitos humanos do governo saudita, sob o comando do príncipe herdeiro. E, recentemente, relatório da Casa Branca culpou este mesmo governo pelo assassinato do jornalista Jamal Khashoggi em 2018. No momento, a principal preocupação geopolítica envolvendo Arábia Saudita e EUA diz respeito à questão da guerra do Iêmen e o fim do apoio norte-americano à coalização militar liderada pela Arábia Saudita. A sinalização saudita indica que qualquer auxílio dos sauditas ao aperto energético europeu e os altos preços do barril estarão atrelados ao posicionamento norte-americano à coalização liderada pela Arábia Saudita no Iêmen.

Figura 2 – Biden e líderes árabes – Fonte: Reuters

 

Um bom relacionamento com os sauditas é de extrema importância comercial. A Arábia Saudita é ainda a maior cliente de armas dos norte-americanos. De fato, internamente dentro do partido democrático existe forte pressão para o congelamento das vendas de armas utilizadas no Iêmen. A participação comercial e a não recriminação deste conflito, é mais uma mancha no currículo de relações internacionais dos EUA. A situação do Iêmen após sete anos de guerra é de estado humanitário deplorável com uma conta de 377 mil mortos, sendo 144 mil crianças.

Após estes recentes movimentos geopolíticos, o oponente russo de moveu. O presidente Vladimir Putin entrou em contato telefônico com Mohammed bin Salman. O ponto principal deste contato ficou bem claro. Enfatizar aos sauditas que as ações da OPEP+ devem estar coordenadas e evitar surpresas aos russos. Qualquer mudança no cenário energético europeu e de mercado global não surgirão de ajuda imediata de países produtores da OPEP+.

Um mapeamento da produção mundial de óleo e gás, sem os reservatórios russos, apresenta o Oriente Médio com imenso potencial de sanar as precárias condições energéticas de parte do continente europeu. Esta organização controla metade da produção global, exercendo poder do controle de preços e oferta. Portanto, qualquer movimentação das peças deste jogo geopolítico passará pela Rússia e, claro, com o aval chinês.

Algumas conclusões podemos tirar destes movimentos geopolíticos. E todas passam pela boa diplomacia com o Oriente Médio.

Os Estados Unidos não podem perder a relação, a ter certo ponto, próxima com a Arábia Saudita e manter a diplomacia existente com outras monarquias árabes do Golfo Pérsico. E desta forma, evitar uma maior aproximação política de Rússia e China junto aos árabes.

Outro ponto importante. Ao manter um canal de acesso com o Oriente Médio, para um alinhamento de ajuda energética ao continente europeu, os EUA buscam blindar sua própria economia dos efeitos da crise energética. Por terem a maior relação comercial bilateral, União Europeia e os EUA, precisam equalizar a questão do suprimento energético rapidamente. E assim evitar outra paralização econômica como a vivida durante a pandemia de covid-19.

 

Referências

  • British Petroleum Statistical Review of World Energy 2022 71°edition

*Luis Augusto Medeiros Rutledge é engenheiro de petróleo e possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Analista de Geopolítica Energética e Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal. Atua como colunista e comentarista de geopolítica energética do site Mente Mundo Relações Internacionais e no CERES – Centro de Estudos das Relações Internacionais. Pós-graduando em Relações Internacionais pelo Ibmec. Possui 16 anos de experiência em Projetos de Pesquisa e Desenvolvimento entre a UFRJ e o CENPES/PETROBRAS. Colaborador de colunas de petróleo, gás e energia em diversos sites da área. Contato: rutledge@eq.ufrj.br

 

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