Momento do Comex #01, por Luis Maluf

Luis Gustavo Maluf – www.linkedin.com/in/luismaluf

A partir de agora todo começo de mês vamos divulgar aqui um panorama global feito pelo Luis, supervisor de uma empresa de logística.

 

PANORAMA GLOBAL – JULHO/2024

O efeito dominó da crise do Mar Vermelho / Canal de Suez se mantém atuante nas rotas para América do Sul. Depois de alterar todo panorama de rotas e frete internacional nos últimos seis meses, os efeitos práticos do acréscimo de transit time e remodelagem das rotas e serviços foram agravados, até junho, pelos embarques de veículos elétricos chineses rumo ao Brasil. Julho nos traz uma visão ainda bastante desafiadora de como o mercado reagirá às pressões atualizadas sobre o comércio internacional.

ÁSIA

A esperada redução na pressão por espaço por parte das montadoras chinesas nos portos de origem aconteceu de fato. Mas como qualquer impacto em um serviço de longa duração, como ocorre na navegação, os desdobramentos perduram em um efeito dominó que atua como ondas de choque.
Até agora:
• Enorme pressão por espaço / equipamentos nos portos de origem;
• Congestionamentos constantes nos terminais e ausência de equipamentos disponíveis nos maiores terminais e portos;
• Fretes inflacionados em mais de 85% devido à oferta de espaço x demanda pelo mesmo;
A partir de agora
• Transbordos foram adicionados em rotas tradicionalmente diretas, como maneira de administrar o overbooking nas origens;
• Esses transbordos que também são grandes hubs de embarque (Singapore, Busan, Shanghai, Hong Kong) estão mais lotados do que nunca;
• O backlog a ser administrado demanda que haja uma menor disponibilidade de saída dos portos principais para que exista espaço nos navios e se aloque o backlog a contento;
• Como os armadores não visam perder a receita que os atuais níveis de frete geram, os navios dos portos principais das origens estão saindo cheios, e os transbordos mantém alta recepção de contêineres chegando, enquanto os de backlog são despachados;
• Por isso a relação de oferta x demanda não parece ter se alterado (quando na verdade, ela ainda não foi sentida pelas pontas de embarque x chegada).

Em suma, os gargalos apenas trocaram de lugar.

Em um quadro amplo de visão, observando quase um ano de variação temos a dimensão das cotações atuais.

Fonte: Xeneta

ESTADOS UNIDOS

Ao contrário do esperado, desta vez é a Costa Leste que chama a atenção para focos de problemas e possíveis fatores disruptivos.
• A ILA (International Longshoremen’s Association) que responde pelas negociações sindicais para operações de terminais, alerta que não houve definições para atualizar os contratos de trabalho que vencem em 30/09/2024. Até esta data então, podemos ter movimentos de bloqueio e greves nos portos da Costa Leste e Golfo, algo inédito até agora – estes movimentos são tradicionais na Costa Oeste – mas a ILA desta vez parece estar focada em uma retórica dura de ação;
• Porto de Charleston – há uma construção em andamento no terminal de Wanda Welch, que está causando um atraso médio de seis dias em cada atracação. Charleston está entre os maiores e mais utilizados portos da Costa Leste, então impactos secundários são esperados não só em transit time, mas em alocação, disponibilidade de contêineres e agendamentos.
• Muitas rotas do Sudeste Asiático para Costa Leste dos EUA sofrem ainda com a passagem pelo Canal do Panamá, que apesar de apresentar uma melhora na quantidade de navios em trânsito, é um foco de atraso médio de uma semana no trânsito total;
• Uma das medidas esperadas por parte dos importadores nos EUA, é trocar a margem (de Leste para Oeste) algo visto durante a Pandemia do COVID, e que criará uma pressão extra sobre os portos da Costa Oeste, que já estão operando em alta capacidade, volatilidade e que já amargam aumentos dos portos principais da Ásia.
• O fator eleitoral tem de ser levado em consideração, já que expectativas diversas são formuladas de acordo com as pesquisas, que indicam vitória Republicana.

Fonte: Xeneta

EUROPA

A Europa foi diretamente afetada pela suspensão das operações em Suez, e seu abastecimento por rotas mais longas tornou-se mais cara. Sofreram ainda o impacto secundário do excesso de demanda pela rota via Europa que abastece não só a América do Sul, como a América do Norte. Desta forma o frete dos portos principais da Ásia para os principais europeus, aumentou significativamente.

Impactos sobre o continente:
• Matérias primas e insumos para produção de itens de alto valor agregado (como os tradicionais maquinários) chegam a preços mais altos e são manufaturados com atrasos consequentes dos congestionamentos no caminho.
• É possível vislumbrar que haverá uma inflação crescente nos preços e nas condições de consumo, além de uma estagnação na política macroeconomia dos países do Bloco;
• Tendências ao protecionismo e à adoção de políticas econômicas ortodoxas tomam corpo com os resultados eleitorais e pesquisas apontando vitórias de partidos à direita.
Situação dos fretes dos principais portos asiáticos para os principais europeus.

Fonte: Xeneta

O Panorama Global para o próximo mês e bimestre, desenha um formato conservador de manutenção, visto que as ondas de choque persistirão por mais um ou dois meses ao menos. Muitos entendem que chegamos ao nível “alto suficiente” de fretes, mas a flutuação não dá sinais de baixa até então.

BRASIL

Alguns fatores-chave agravaram também o trade LATAM e, especificamente o Brasil na conjuntura desenhada:
• Alguns navios foram retirados do tráfego Asia x LATAM e realocados no trade Asia x Europa para que a continuidade e integridade dos schedules via Cabo da Boa Esperança fossem mantidos;
• Os contêineres estão com um tempo de trânsito total maior do que o projetado devido aos transbordos cheios, e isso prejudicou demasiadamente a reposição de vazios nos terminais;
• Uma nova pressão foi gerada sobre os free times nos destinos;
• Navegantes, Itapoá e, em menor grau, Paranaguá, apresentam variações nas operações devido a circunstâncias climáticas;
• Rio Grande desenha-se como um desafio grande no que tange à integridade das operações até que se tenha visibilidade total de como as operações nos terminais serão readequadas às
prejudicadas vias de acesso locais.
As exportações para Estados Unidos, Europa e América Central enfrentam agora vários GRIs e contingências referentes aos impactos descritos acima e a expectativas de:
• Aumento de volume com o câmbio favorável ao Real (exportações de oportunidade);
• Safras que estão em curso e que se iniciarão;
• Baixa disponibilidade de equipamentos nos terminais e congestionamentos nos portos são esperados para o próximo bimestre.
A pressão, portanto, sobre os fretes será contínua e não é prevista uma “normalização” ao menos para o próximo bimestre.