Geopolítica Energética #01 – As implicações dos decretos executivos de Donald Trump no cenário energético global, por Luis Rutledge

*Luis Augusto Medeiros Rutledge é Engenheiro de Petróleo e Analista de Geopolítica Energética. Possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Pós-graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo IBMEC. Atua como pesquisador da UFRJ, Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal, Consultor da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior – FUNCEX, Colunista do site Mente Mundo Relações Internacionais e autor de inúmeros artigos publicados sobre o setor energético.

 

As implicações dos decretos executivos de Donald Trump no cenário energético global

A política energética dos EUA, após as novas resoluções do Presidente Donald Trump, reposiciona o petróleo como a mais relevante fonte energética do país. De imediato, o retorno de Donald Trump à Casa Branca provavelmente significará outro sério revés para as iniciativas de política climática e ambiental. E, naturalmente, causará implicações não apenas para os EUA, mas também para a política climática global.

As novas políticas climáticas dos norte-americanos podem também prejudicar os esforços internacionais para conter as mudanças climáticas. Entretanto, um oceano de oportunidades para o Brasil e países da União Europeia serão criados com a retirada dos EUA dos acordos climáticos internacionais.

Nos EUA, os combustíveis fósseis ainda dominam a matriz energética, respondendo por 84% do fornecimento de energia, apesar do crescimento das energias renováveis. O país tem grandes reservas de petróleo e gás natural, principalmente devido à revolução do fraturamento hidráulico (fracking), que impulsionou a produção de xisto. Isso não apenas garantiu o abastecimento interno, mas também fortaleceu os EUA como um grande exportador de petróleo e gás natural liquefeito (GNL).

Quanto às medidas energéticas amargas de Trump, de imediato podemos destacar o afastamento da Lei de Redução da Inflação (IRA) – o programa de investimento iniciado por seu antecessor Joe Biden para uma reestruturação da economia favorável ao clima. Outra medida pesada de Trump foi a retirada renovada do Acordo Climático de Paris, medida que garante mais liberdade aos EUA no consumo de combustíveis fósseis ao menos no médio prazo. Imediatamente, este direcionamento do governo Trump significa que os EUA deixarão de participar nas negociações internacionais sobre a proteção do clima, rejeitando qualquer movimento global para inserção de energias renováveis.

Deve-se observar que as ações de Trump são minuciosamente calculadas para que setores importantes naveguem a mesma onda que o presidente reeleito. Partindo deste raciocínio, regulamentações mais frouxas podem impulsionar os combustíveis fósseis e uma redução na equipe regulatória pode atrasar o processo de licenciamento para projetos de energia renovável.

A indústria presume que o governo Trump relaxará os regulamentos sobre as emissões de combustíveis fósseis. Isso pode inclusive causar um retrocesso ao prolongar a vida útil de algumas usinas de carvão. No entanto, é mais provável que os padrões relaxados de emissão de combustível incentivem a expansão dos geradores de gás natural. Os projetos eólicos offshore, que muitas vezes foram criticados pelo presidente Trump, podem enfrentar atrasos na obtenção das licenças ambientais necessárias para implementar. Ações do governo já indicam a redução do número de funcionários nos setores reguladores, visando atrasos ou cancelamentos nos processos de licenciamento para qualquer tipo de projeto de energia renovável.

Afim de atingir ainda mais o setor de energia renovável, Trump criou atrasos burocráticos ao desenvolvimento da energia eólica, pedindo uma suspensão temporária dos arrendamentos estaduais e a emissão de licenças para novos projetos eólicos até que novas investigações sejam conduzidas.

Espera-se um atraso de vários meses, mas não uma reviravolta abrangente dos processos comprovados que as autoridades federais precisam para realizar a devida diligência e emitir licenças para projetos eólicos. No entanto, a ordem pode resultar na assinatura de novos contratos de arrendamento para projetos eólicos em terras federais ou em águas federais sendo completamente interrompida. Com menos de 10%, esses projetos representam uma parcela relativamente pequena da expansão total das turbinas eólicas.

União Europeia.

 

Alguns movimentos do governo Trump, apesar da negação climática, vão de encontro com alguns gargalos energéticos do continente europeu. A suspensão do novo governo ao congelamento da aprovação do governo Biden em novos terminais de exportação de GNL. Isso poderia dobrar as capacidades de exportação dos EUA nos próximos cinco anos.

Nos setores industriais e nos gabinetes da União Europeia, a liberação de novos terminais de GNL se traduz em gás adicional dos EUA, tendo em vista o afastamento da Rússia. As declarações da Comissão Europeia já vão nessa direção. Ursula von der Leyen, atual presidente da Comissão Europeia, quer acelerar as próximas negociações comerciais com compromissos de importação de GNL oriundo dos EUA, a fim de evitar a ameaça de tarifas por parte do governo norte-americano.

Vale destacar, como veio frisando desde o início da Guerra da Ucrânia, que o não desenvolvimento de propostas e projetos internos em outras fontes energéticas, manteria a União Europeia num eterno colonialismo energético, trocando apenas a bandeira do navio exportador de GNL.

Uma prova disto: mais de 80% do combustível nos terminais alemães de GNL já vem dos EUA. Depois que a Alemanha acaba de se tornar independente do gás russo, a nova política energética de Donald Trump ameaça empurrar o país para uma nova dependência.

 

Brasil.

 

O país deve ser observado por outra perspectiva. Para diversos setores da economia brasileira uma janela de oportunidade e investimentos se abrem para a energia renovável. A nossa matriz energética amplamente renovável deve seguir para o próximo passo, colocando o país no papel relevante de exportador de tecnologia e energia limpa.

Com a matriz energética dos EUA retornando aos maiores investimentos para os combustíveis fósseis e a ampliação da produção de petróleo e gás de xisto, um desalinhamento surgirá entre os compromissos ambientais dessas empresas e as oportunidades de investimento nesse mercado.

Para manter sua posição alinhada às diretrizes essas empresas podem buscar novos mercados, como a Europa e o Brasil, onde há uma regulação mais rigorosa sobre sustentabilidade, ou investir em setores de energia renovável e tecnologias de baixo carbono, principalmente na indústria brasileira.

O retrocesso ambiental do governo Trump abre um leque de oportunidades aos investidores e os diversos setores da agroenergia brasileira, onde programas e pesquisas do país, destacando o etanol e o biodiesel, atraem países europeus e asiáticos interessados em alternativas energéticas limpas.

A retirada de campo dos investimentos norte-americanos em energia renovável somadas à capacidade brasileira de gerar energia limpa através da abundância de recursos naturais e aos esforços do governo Lula para impulsionar o país como referência climática e energética, devem se transformar em novos negócios de exportação para a economia brasileira.

Investimentos e infraestrutura deverão naturalmente crescer transição energética e ao meio ambiente. Maior economia do mundo, os Estados Unidos lideram em emissões de carbono per capita.

Uma prova disto, vem da União Europeia. Países europeus têm promovido a utilização sustentável da biomassa através de diversas políticas e incentivos, garantindo que sua produção e uso não comprometam a biodiversidade, a segurança alimentar ou a qualidade dos ecossistemas. Isso inclui a adoção de critérios rigorosos de sustentabilidade para a produção de biocombustíveis e biomassa sólida, além de investimentos em tecnologias avançadas, como a bioenergia com captura e armazenamento de carbono (BECCS).

A União Europeia deve ser olhada com carinho especial pela indústria agro brasileira. O país domina as importações de soja da EU. A soja é a oleaginosa mais importante importada para a União Europeia, à frente da colza. Nos primeiros quatro meses da atual campanha comercial, a UE importou mais soja do que em qualquer momento desde 2021/22.

A geopolítica energética deve ser analisada por diversas perspectivas. Se por um lado um império como os EUA está caminhando para o retrocesso energético, por outro lado oportunidades econômicas estão em crescimento para países que possuem novas tecnologias e recursos naturais voltados para a geração de energia limpa. Em suma, a janela de oportunidades está aberta e o Brasil preenche os requisitos incomparáveis para promover as energias renováveis.

 

 

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